sábado, 24 de janeiro de 2009

Sala do pano

Em 17 de Abril de 1904 estava fundado o team do The Bangu Athletic Club, formado por técnicos de máquinas ingleses e operários brasileiros da então fábrica de tecidos Companhia Progresso Industrial do Brasil. Após uma remessa feita da Inglaterra de produtos para a fábrica foram encontradas, camufladas estrategicamente dentro de caixas, uma das primeiras bolas de foot-ball do Rio de Janeiro e alguns pares de chuteiras. O primeiro passo, o drible incial, já havia sido dado e, como consequência de qualquer um que tem uma bola em mãos, foi providenciado então o field que depois seria chamado por Ary Barroso como "a cancha encantada da rua Ferrer", de grama inglesa.
Em tempos de amadorismo, a montagem do time necessitava de certas estratégias pois, para atrair um bom jogador para defender seu escrete, se fazia mister oferecer um bom bicho, uma boa comida, algumas regalias e um bom emprego, não cessando nestes quesitos as possibilidades de atração. Caso contrário, um corpo mole ou uma febre repentina poderia acometer um jogador já vestido, na boca do túnel, a 10 minutos do início do match. Aos times considerados grandes isto era mais fácil, já que ofereciam, além dos melhores bichos, o Glamour de seus salões e o convívio com os hábitos "refinados" da elite que compunha seus quadros sociais. Já no caso do Bangu, assim como em outros times originários de fábricas, o que contava mesmo era um bom emprego em troca de um belo passe ou um gol de placa.
Mas o craque nunca foi bobo e também nunca foi de trabalhar. Apesar de não ganhar profissionalmente por isso, sabia de sua importância simbólica, tinha noção de que regalias seriam o mínimo para que suasse a camisa pela consagração do team. A Companhia Progresso Industrial sabia disso e, como barganha para a "contratação", dependendo do jogador, arrumava um emprego na fábrica em troca do seu "passe". Se jogasse pouco ia parar na sala de tintas, onde um simples descuido, uma simples gota na pele podia causar um belo estrago. Este tinha a falta descontada e era cobrado, ainda que em menor escala em relação aos que não participavam do time. Já os bons de bola, paparicados pelos donos da fábrica, eram colocados para "trabalhar" na sala de pano, o lugar mais almejado por todos os funcionários, pois era lá onde se menos suava, onde a labuta era mais leve, uma vez que a função do encarregado deste setor era somente dobrar os panos que chegavam lá já prontos. Ainda assim, era raro ver um jogador de destaque aparecer ao som do apito.
A sala do pano era o lugar reservado aos que faziam a diferença, ao imprescindíveis ao sucesso do time, aos que, na realidade, carregavam nas pernas o chamado às arquibancadas, árvores e morros das redondezas dos campos de futebol. Aqui vamos fazer a nossa própria sala, sempre que houver uma rodada onde algum time carioca entre em campo, seja ele considerado grande ou pequeno. A cada rodada vamos mandar alguém pra sala de pano e de tintas, a cada match vamos analisar de maneira passional os escudos e cores que movimentam nossas vidas em direção ao gol.
Enfim o ano vai começar...

Um comentário:

  1. Caramba! Muito legal! Não sabia dessa história do tradicional alvirrubro. Sabia da fábrica, claro, mas não da sala do pano.

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