terça-feira, 5 de outubro de 2010

Manifesto em defesa do torcedor

Torcedores, clubes de futebol e estádios são todos partes de um mesmo corpo. Os clubes não existem sem sua torcida, que lhe ofereceu a existência através da amizade nascida dos campos de pelada espalhados pelo mundo. O clube não existe sem o estádio, que é o palco de congregação de todos aqueles que compartilham os mesmos sentimentos, as mesmas cores e o mesmo canto. O estádio não existe sem os torcedores, sua única razão de ser, pois sua função é receber justamente aqueles que lhe fornecem o sopro da vida no grito de gol. Tudo que existe e se relaciona direta ou indiretamente ao futebol, sobrevive do pulsar do mesmo coração, aquele que acelera nas arquibancadas fazendo o concreto dançar e os outros times tremerem. Apesar disso, diante das medidas já existentes e as que foram anunciadas, parece que o futebol está fazendo a escolha pela insensibilidade do dinheiro.

A transformação do futebol em espetáculo, do torcedor em consumidor e do jogador em mercadoria aponta o caminho que está sendo traçado para o futuro do esporte. Diante da necessidade constante de gerar receitas, seja dos clubes, da mídia ou dos patrocinadores, os estádios perdem cada vez mais a sua capacidade e, em contrapartida, os preços para se assistir a uma partida sobem a cada ano. Temos em curso a política do “menos é mais”, que vê no estádio um shopping, onde o jogo de futebol é apenas um detalhe, uma alternativa oferecida pelo empreendimento de entretenimento. Um espetáculo para poucos, somente para os que podem desembolsar um bom dinheiro num país onde o salário mínimo é de R$510,00. Até mesmo os clubes criam lojas, produtos e espaços “Vips”, preocupados em fidelizar o consumidor de alto poder aquisitivo, deixando na reserva a grande maioria de sua torcida.

A televisão é a dona da bola e como tal decide os dias e horários dos jogos de acordo com a sua grade de programação. No meio de semana temos o jogo Corujão, que muitas das vezes começa na quarta e termina na quinta-feira, praticamente inviabilizando a ida ao estádio do torcedor. Não bastasse isso, ainda que um herói decida estar no estádio, é inexistente qualquer plano em relação ao transporte que viabilize sua chegada e sua saída em segurança. Diante do alto preço dos ingressos, da dificuldade de acesso e do horário escolhido, resta ao torcedor escutar o rádio ou aderir a um pacote da TV fechada, esvaziando os estádios e aumentando os lucros de quem comanda o calendário nacional.

Nós, como torcedores, devemos ter em mente que toda esta roda da fortuna se alimenta do nosso amor clubístico, que recebemos de nossos antepassados e que repassamos com carinho e devoção às gerações futuras. Não existe nada neste circuito que não dependa de nós. Os jornais e programas esportivos só existem e são lidos e vistos em razão da nossa existência. Os produtos licenciados, as camisas e acessórios dos clubes só são vendidos porque compramos. Até mesmo o valor do clube é estipulado mediante o potencial de sua torcida. E aí surge a principal questão: em que ponto nos fazemos ouvir, defendendo nossas demandas e reivindicações? Dentro de qual esfera sentamos ao lado dos outros atores do futebol para negociar os rumos do calendário ou a política de aumento dos preços dos estádios? Ou o horário da partida?

A criação de uma Associação Nacional dos Torcedores é fundamental para que possamos defender nossas reivindicações. Somos contra a elitização dos estádios de futebol, com o fim dos espaços populares que fazem parte da construção de identidade da própria cidade, extrapolando seus limites meramente esportivos. Estes espaços contam uma história, revelam costumes e formas de agir, além de ser um espaço crucial de manifestação lúdica acerca dos principais temas nacionais. Defendemos um acesso democrático e amplo, que garanta a todos os torcedores, sem distinção de renda, assistir a uma partida de futebol no estádio, mediante um preço razoável tendo como base o salário mínimo, um horário adequado que não ultrapasse às 17 horas aos sábados e domingos e 20h no meio de semana, com um esquema de transporte especial que viabilize sua chegada e saída sem maiores transtornos.

Defendemos também a obrigatoriedade da publicação anual em mídia impressa e eletrônica de grande circulação das dívidas e receitas relacionadas ao futebol. Lutamos contra a falta de transparência no futebol brasileiro, há décadas nas mãos de dirigentes incompetentes e corruptos. Exigimos a democratização das decisões acerca do futebol brasileiro com a participação dos torcedores, como por exemplo, no caso das sucessivas e milionárias reformas do Maracanã, feitas sem nenhuma consulta aos torcedores.

Somos maioria. Quando queremos, derrubamos treinadores, jogadores, presidentes e comissões técnicas. Quando unidos, convocamos jogadores para a seleção nacional e criamos os culpados e heróis das derrotas e vitórias que vão estampar os jornais do dia seguinte. Nós eternizamos os ídolos, escrevemos as placas, tornamos os jogos inesquecíveis e as festas insuperáveis. Nós somos tudo, o gol, a derrota, o drible, a cusparada, o coice, o lençol e o drible-da-vaca. Entoamos das arquibancadas as ordens que ditam o rumo da história que transcorre nos gramados, tapetes ou esburacados, secos ou enlameados. Decidimos o que vai ser vendido e o que vai encalhar, a manchete, a chamada do jornal e o replay da TV.

É urgente a organização de uma entidade que possa ser nosso grito nas negociações de tudo que envolve o futebol e nós, torcedores, que somos a sua finalidade. Estamos sendo atacados pela voracidade do capitalismo que, impiedoso, quer ser o dono da bola, do campo e dos pensamentos, indiferente aos sentimentos e afastado de nosso amor, necessitando apenas do dinheiro para lubrificar sua engrenagem e se movimentar. Seguiremos juntos até o título final, numa grande torcida organizada, devolvendo ao futebol o coração dispensado em detrimento do lucro, tornando-o, novamente, uma expressão popular da identidade nacional. Não somos a parte. Somos o todo.

Obs: vamos ocupar as redes sociais. Estou no twitter: @futebolpratodos. Tem também o @ANTorcedores. O Blog com a data da primeira reunião e nossas reivindicações é esse: http://respeitemofutebol.wordpress.com/

Conto com a adesão de todos.

Saudações tricolores

4 comentários:

  1. Contem comigo, precisamos virar este jogo.
    Saudações tricolores (paulista)

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Beleza, Michel, bom contar contigo! Repasse para seus contatos e redes sociais, pra que o movimento ganhe a rede.São Paulo é fundamental, assim como os outros grandes centros. Fique ligado que vamos informando o que for acontecendo. Se quiser, segue lá no twitter.
    Grande abraço e saudações tricolores

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  4. Reflexivo e emocionante, Capelli!!
    Estamos juntos, nas três cores que traduzem tradição, mas acima de tudo porque amamos e pensamos o futebol.
    Abração
    Chico

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