domingo, 20 de fevereiro de 2011

“Não confio em um sociólogo que não tenha o fundilho das calças puído pelas arquibancadas!”


A frase do título foi atribuída ao cientista social da USP Gabriel Conh pelo jornalista Juca Kfouri em palestra denominada Futebol Resistência, realizada ontem, em São Paulo, no Memorial da Resistência.

Como estou passando uma temporada na terra da garoa resolvi conferir a atividade apenas para relatar aqui neste blog, já que eu já sabia que obviamente o Murici seria eliminado em mais um mata-mata e que, portanto, nosso anfitrião não compareceria nestas plagas para falar sobre o vexame tricolor.

Pois bem, foi uma atividade emocionante. A palestra foi pano de fundo para uma homenagem militante político Aderval Alves Coqueiro, brutalmente assassinado em 1971 pela Ditadura Militar instaurada em 1964, em uma operação com 50 policiais na qual o revolucionário brasileiro estava desarmado. A homenagem foi preparada pelo Núcleo Memória do memorial, vale a pena conferir o site e dar um apoio a este tipo de iniciativa: www.nucleomemoria.org.br.

Na palestra, o jornalista Juca Kfouri insistiu que Futebol e Política possuem uma ligação sim, mas que esta deve ser mediada e está distante do velhor jargão da esquerda de que “o futebol seria o ópio do povo”, ou que “cada gol da seleção brasileira atrasa em dez anos a revolução”. Ele afirmou que por mais que a Ditadura Militar tenha tentando se utilizar do tricampeonato na Copa do Mundo, e de fato o tenha feito, isto não impediu que o processo político se desenvolvesse e que o regime militar fosse perdendo apoio popular ao longo da década de 1970 até cair de vem nos anos 1980. O exemplo do presidente FHC, que em 2002 recebeu a seleção pentacampeã e depois viu seu candidato perder pro Lula nas eleições também foi evocado.

Qual seria a relação entre a bola e a política então? Juca Kfouri abordou dois aspectos desta relação com as quais eu concordo. Primeiro, o fato de que a esquerda brasileira luta para tornar nosso povo e nossa nação livres das opressões e das injustiças que nos marcam faz mais de 5 séculos. E que isto só será possível se soubermos mobilizar os elementos mais autênticos daquilo que a sociedade brasileira produziu ao longo da sua história. O futebol, sem nenhuma dúvida, é um destes elementos.

O segundo é auto-organização dos setores envolvidos no mundo da bola, começando pelos jogadores. O jornalista nos relata que no Uruguai e na Argentina o futebol da primeira divisão para se os boleiros de um time pequeno da terceira divisão têm um mês de salário atrasado. Aqui alguns dos nossos grandes clubes atrasam 3 meses. Os torcedores precisam também se organizar politicamente, e não apenas para torcer. Algo a ver com a Associação Nacional dos Torcedores???

O debate sobre a organização da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil também foi abordada. Kfouri manifestou uma posição um pouco mais moderada daquela que vejo como majoritária na ESPN, que é vocalizada por ele e por outros jornalistas, simplesmente contrária a realização destes eventos em nosso país por significar desperdício de dinheiro público . Juca disse é preciso levar em conta que um governante precisa brigar e organizar eventos deste tipo para agradar seu povo. Além disso, ele defendeu que temos que fazer uma Copa Do Mundo do Brasil e não uma Copa do Mundo da Alemanha. Nesse sentido, e eu concordo, deveríamos dizer não para as exigências que a FIFA está impondo ao nosso futebol e que vão entre outras coisas, desfigurar o Maraca Velho de Guerra.

A grande contradição no discurso do Juca, em minha opinião, foi o peso excessivo que ele atribui ao Estado na solução dos problemas do nosso futebol e do nosso Esporte, e por solução leia-se derrotar Ricardo Teixeira e Nuzman, os senhores feudais dos nossos atletas. Kfouri manifestou profunda decepção com Fernando Henrique e Lula, relatando que no inicio do governo de ambos fora procurado para, em conjunto com outras personalidades do esporte, formatar um projeto de longo prazo para o esporte brasileiro, projetos que foram abandonados nos primeiros seis meses porque se confrontavam com os interesses destes déspotas.

Eu até concordo que o Lula pelegou em relação ao Ricardo Teixeira. Mas o fato é que este se fortaleceu muito após as CPIs da Nike e do Futebol em 2000. E também que sem a auto-organização dos atletas e dos torcedores, o Estado não fará muita coisa. Eu penso que para as mudanças ocorrerem, em especial em estruturas tão reacionárias como as do nosso futebol, é preciso alguma pressão dos debaixo sobre o Estado. Este tem sim o seu papel nesse processo, não se moverá sozinho.

Para concluir, para quem já viu o Juca Kfouri na tv, gostando ou não dele, sabe que o cara é espirituoso, bom contador de histórias. Algumas boas foram referentes à famosa e saudosa Democracia Corintiana, regime de auto-organização da geração de jogadores do Timão no inicio da década de 1980, liderado por Sócrates, Casagrande, Vladimir, entre outros. Os caras votavam até o trajeto do ônibus, não concentravam, bebiam antes dos jogos, enfim, não faziam parte da chatice que o mundo do futebol se tornou e não eram gordos e decadentes como o Ronaldo. A dialética certa que eu espero que o showman da gávea, indo pros seus pagodes, consiga atingir. Foram bicampeões paulistas e não ganharam nada nacionalmente porque existia uma máquina demolidora no futebol brasileiro chamada Clube de Regatas do Flamengo, comandada por Zico! Mas ai já é outra história...

Enfim , já que Cappelli estuda Futebol e e eu estudo Política, quem sabe agente consegue ajudar o Juca Kfouri a desvendar os modos de interação entre estas duas esferas. Quando as crianças fizerem 18 anos começamos a escrever sobre isso!

Saudações Rubro-Negras

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