Fidalgos leitores, diante da polêmica gerada pelos erros de arbitragem nas oitavas surgem vociferantes os defensores da utilização da tecnologia no futebol. A lógica utilizada é a mesma dos que argumentam a favor da redução da maioridade penal pra 16 anos quando algum adolescente comete um crime ou os que levantam a bandeira da pena de morte assim que alguém de classe média da zona sul é assassinado, promovendo passeatas pela orla de Copacabana vestidos de branco e apoiados pelo movimento "Viva Rico". Vejam bem, eu disse a lógica, não a pessoa. Seja dolescente, homem feito ou juíz de futebol, seus erros são usados como pretexto para mudanças drásticas, quase sempre para pior. Mas, é claro, só quando são contra nosso time ou seleção porque, a favor, ninguém diz nada, ou acha graça depois de ver o "Fabuloso" ajeitar a bola com a mão duas vezes antes de marcar contra os africanos. A utilização da tecnologia, na ocasião, não foi pauta em nenhum programa esportivo.
O grande problema é que em todas as questões os argumentos utilizados são rasos e contam com um apelo popular considerável para que sejam aprovados e, é claro, garantem a popularidade eleitoral aos aproveitadores - autores das propostas, vide família Bolsonaro e Renato Maurício Prado, o mais pedante da atualidade. Não podemos esquecer que é justamente em momentos de crise que são tomadas as piores decisões da humanidade, onde são cometidas as maiores atrocidades em nome da lei e da ordem. O que quero neste texto de hoje é defender a não utilização da tecnologia no futebol, fornecendo elementos acerca da discussão que nos façam problematizar de maneira qualificada o debate, ajudando a tomar nossas decisões diante dos fatos expostos.
O grande problema é que em todas as questões os argumentos utilizados são rasos e contam com um apelo popular considerável para que sejam aprovados e, é claro, garantem a popularidade eleitoral aos aproveitadores - autores das propostas, vide família Bolsonaro e Renato Maurício Prado, o mais pedante da atualidade. Não podemos esquecer que é justamente em momentos de crise que são tomadas as piores decisões da humanidade, onde são cometidas as maiores atrocidades em nome da lei e da ordem. O que quero neste texto de hoje é defender a não utilização da tecnologia no futebol, fornecendo elementos acerca da discussão que nos façam problematizar de maneira qualificada o debate, ajudando a tomar nossas decisões diante dos fatos expostos.
Em primeiro lugar o futebol, assim como qualquer outro campo de estudo, sofre as alterações promovidas pela dinâmica capitalista que impõe novas regras a cada jogo. Como passou a ser também visto como espaço de negócios onde se gera renda e trabalho e, principalmente, lucros, não seria ele que fugiria das adaptações necessárias a um empreendimento que maximize os lucros e minimize as perdas, pra usar o jargão econômico. Pois bem. Esse dinamismo gerado pela constante necessidade de adaptação e renovação, onde o ontem é obsoleto, fez com que a informática e a tecnologia assumissem a ponta no processo de informatização e velocidade da informação, pontos estes que constituem o alicerce do desenvolvimento deste empreendimento global. Ou seja: se o futebol é negócio, empresa, que pretende gerar lucro e se, mais além, o campeonato, seja ele qual for, é um produto a ser oferecido ao consumo do mundo, poderia ele dispensar o uso da tecnologia para a sua qualificação? Entraria o futebol, finalmente, no grupo dos esportes onde o resultado é sempre o justo? É hora de aposentar a vitrola e a fita de vídeo pra tocar MP3 e Blue-Ray?
Um segundo ponto a ser levantado faz menção ao estatuto do trabalho em si, ou seja, a desqualificação do trabalho artesanal e humano em função de uma demanda global homogênea. Num tempo onde padeiros não precisam saber fazer pão e sapateiros não precisam saber fazer sapatos, basta que dominem o programa de computador que realiza a tarefa, chegaremos então ao tempo em que não precisa saber nada de futebol pra ser juiz? Com o uso da tecnologia o homem de preto pode ser qualquer um, até mesmo um robô com câmera que somente repasse as ordens recebidas do seu controlador de algum lugar do estádio, onde ele verá o replay. E aí surge um dos problemas cruciais: quantas vezes não vimos na TV um grupo de comentaristas discordar, mesmo depois de ver trezentas vezes o mesmo lance? Ou seja, o cara vai ver o replay mas, de qualquer maneira, ele terá que interpretar o que está vendo e isso, de maneira categórica, torna inviável a assepsia tecnológica. Aí, imaginem: falta na grande área: pênalti ou não? Mesmo com a tecnologia, a interpretação humana nunca poderá ser deixada de lado, ainda que em alguns lances, como o gol da Inglaterra, ela não deixe dúvidas.
Ah, então ela seria usada somente para lances capitais. Impossível. Quem me garante que uma falta que não existiu na intermediária vai gerar um cruzamento que resultará em gol, sendo tão capital quanto a marcação de uma penalidade? Quem me garante que a expulsão injusta de um jogador não vai ser fundamental pra virada do outro time, sendo então fundamental novamente no resultado do jogo? Não adianta: no futebol, fidalgos amigos, qualquer lance é potencialmente capital e pode mudar o destino do jogo, tornando impossível escolher em que momentos ou em que lances a tecnologia deve ser utilizada. Ou se utiliza em todos os lances ou não se utiliza. Não existe argumento que sustente o contrário.
Outros fatores ajudam a compôr ainda melhor o quadro. Façam um esforço e imaginem comigo quinhentas partidas de futebol em um domingo no mundo. Imaginem a quantidade de faltas, expulsões, impedimentos e cartões, só pra citar algumas possibilidades do jogo. Se levarmos em consideração os acertos dos quinhentos juízes e mil bandeirinhas durante os noventa minutos em relação aos seus erros, podem ter certeza, estes últimos serão irrisórios em uma relação estatística, um caso de 90% pra 10% o que é completamente aceitável. Só por comparação, todos nós sabemos que o avião é mais seguro que o transporte rodoviário. Sabemos disso porque na proporção entre vôos realizados e acidentes que acontecem, temos um número aceitável de desastres que garante a sua segurança. Mas eles acontecem!!! E, vejam bem, os acidentes estão dentro do contexto, são possibilidades reais e que são levadas em consideração, já que não existe, em nenhum aspecto, a segurança total, seja da chegada ao destino ou do apito exato. Em qualquer lugar do mundo onde se exige segurança máxima, existe um cálculo que compõe a margem de erro, tão presente em nossas pesquisas eleitorais.
Outros poréns também estão em jogo e contam para a implementação da tecnologia no futebol. Com a sua utilização, o tempo de jogo seria, com certeza aumentado, tendo em vista as paralisações para análise das jogadas e lances polêmicos. Como a televisão iria lidar com este aumento de espaço na grade de programação e com a perda da emoção do lance duvidoso que é a base, a essência dramática do seu produto? Afinal, na televisão ninguém gosta de ver o justo e o bonzinho, o final feliz, todos gostam mesmo é do vilão, da tragédia, daquele zagueiro carniceiro, do animal e do gladiador, do gol de placa do craque anulado, do drama das decisões erradas, inerentes a qualquer ser humano. Quarenta e cinco minutos iam se transformar com certeza em mais de uma hora, uma vez que o cronômetro deverá ser parado enquanto o lance é analisado sabe-se lá por quem e com que competência. E, por fim, o pior de tudo, a mais desgraçada de todas as consequências possíveis: ter que gritar gol sem a bola estufar a rede. Isso não existe. O cara chuta e...foi gol ou não? Pausa para análise dos tecnocratas da computação gráfica. Vem o resultado no telão: "É gol" O artilheiro que estava de braços cruzados no meio-campo, já sem nenhuma emoção, nem comemora, só ajeita o meião, a mesma coisa a torcida, que perdeu completamente o êxtase da jogada, aquele momento mágico. Um legítimo gol CPU, que só vai fazer gozar os mecanicistas da bola que, na ausência de talento e sorte, sempre apelam pro VT.
Um último problema é a adesão da FIFA ao uso da tecnologia. Não podemos esquecer que a FIFA muda as regras de todo o futebol, não só deste ou daquele campeonato. Tudo bem uma rodada na Premier League com os lances sendo analisados por computadores. Agora imaginem isso no interior do Brasil, No campeonato Acreano. Quem será capaz de garantir o aparato tecnológico em todos os campeonatos uma vez que eles serão regra? Todas as federações deverão se equipar e instalar nos estádios as câmeras e computadores para análise do lance. É necessário também o treinamento do sujeito que vai manipular o equipamento. E, por fim, fica a pergunta: quem será a autoridade máxima em campo: o juiz ou o homem do CPU? Na hora de reclamar, reclama com quem? Enfim, em estádios que mal tem lugar pra sentar e com a maioria das federações falidas, imaginem o que seria a obrigatoriedade deste aparato...
Como vocês podem perceber, sou contra a utilização da tecnologia. O máximo que aceitaria é um chip na bola, pra saber - e comemorar - na hora se ela entrou ou não e, mesmo assim, somente nas finais. Evitaria até mesmo a má fé de um Edílson da vida. Aceitar o erro do juiz é ter a certeza de que nada é certo, de que não deixaremos de sair de casa por causa das balas perdidas e de que continuaremos voando nas cadeiras apertadas da gol mesmo que um ou outro airbus exploda no ar matando todo mundo. Não saber ao certo é a essência da humanidade e, assim sendo, em meu ponto de vista, não vejo nenhum problema na incerteza do Referee.
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